De um dos seus livros, “O rio que
passa”, o jornalista e poeta Carlos Laerte enviou uma bela crônica para
homenagear os 117 anos de Petrolina, comemorados nesta sexta-feira (21).
Confiram:
Os Meninos e as frutas
Roteiro de meninos vadios corria
mundo e sempre acabava debaixo de uma árvore. Quando não era umbu cajá
nas manhãs do quintal do Sr. Zé Nunes, ali onde um velho umbuzeiro virou
estacionamento do JB Hotel, nos deliciávamos com os jatobás da casa dos
Santana. Quem não gostava de castanhola era menino besta. As melhores e
mais saborosas, a gente sempre encontrava na calçada de Augusto Amador
ou na velha Apami, ali onde seu mais produtivo pé há muito já virou
Banco do Brasil. Menino que era menino mesmo, corria mundo e, volta e
meia, roubava cajus na capelinha do hospital Dom Malan.
As goiabas brancas ou vermelhas
vinham fácil das mãos de Dona Luzinete, na casa de Dr. Ferraz. Tempo de
goiaba era tempo doce. Era! O dia a dia da gente menino começava e
invariavelmente terminava na copa de uma fruteira. Algumas vezes, metros
acima do mundo, contemplávamos tudo do alto de uma mangueira.
Escondidos daqueles que não sonhavam mundos perfeitos, imaginávamos
sempre namorar a menina mais bonita da rua. Na manhã seguinte, já em
grupos, a gente saía pra catar umbu na lagoa de Basílio. Essa era, na
época, a tática mais acertada para arrumar namoro. Umbu fresquinho,
carnudo como o primeiro beijo debaixo das quixabeiras.
Quando alguém ficava rouco de tanto
chamar pelos apelos que a gente sequer ouvia, tinha sempre um quintal
amigo com suculentas romãs. Mamãe obrigava gargarejar a casca, mas era o
miolo que eu sempre comia. E as condessas do Sr. Dão? Só depois de anos
a fio de intermináveis delícias é que vim descobrir que elas não são,
na verdade, as frutas do conde. Muito mais nobres e pomposas que as
velhas e saborosas pinhas de Atrás da Banca. Ali na Dom Vital tinha uma
tia de um amigo meu que era bem velhinha. Da sua janela, a gente pegava
com a mão e depois ia comer, debaixo do pé, o figo que ainda não
conseguiram enlatar.
Menino que era menino corria rua
acima, lua abaixo, mais não dormia sem antes chupar uma boa manga com
sal. Epa! Gritava a mãe assombrada, manga de noite faz mal! Banana
também! Atrás da casa de Geraldo Azevedo tinha cada banana que acabava
com qualquer promessa de mãe. Sair de bicicleta sem rumo só pra
descansar no velho juazeiro, que ficava do outro lado do rio, era coisa
pra menino de coragem. A maioria dizia que não gostava do pequeno juá
amarelinho. Pura desculpa. Seriguelas de vez tiravam o sossego de dona
Albertina Guimarães.
Os jambos quase não ficavam maduros
no quintal de Sr. Cândido Miranda. Tamarindos, melados, as azeitonas
pretas da Casa Rural, que também vai virar prédio residencial. Corre
menino, que lá vem tiro de sal. Coco verde pra vara curta. Tudo era
muito mais verde. Os meninos mais ecológicos. Aquele que não nadasse até
a pedra não era homem. E as frutas? Menino, corra no supermercado e me
traga mangas bonitas, tipo exportação, grita hoje a mãe atarefada. Lá no
quintal, em todos os quintais de Petrolina agora, amadurecem no pé,
velhos sonhos, desejos dos meninos de outrora.
Carlos Laerte/Poeta, Jornalista e Diretor da CLAS Comunicação & Marketing
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